Foi na Terceira, em Angra, que se estabeleceu a primeira cidade dos Açores e a sede da Diocese açoriana, com a criação do Bispado de Angra e Ilha dos Açores, em 1534. Decidiu-se pela urgência da construção de uma nova Igreja, assim, em 1570, dava-se início à construção da Sé Catedral de Angra. As obras da Sé foram interrompidas aquando da crise de sucessão de 1580.
Após um período de 3 anos, em 1583, os espanhóis conseguiram invadir a Terceira, através do desembarque da Baía das Mós. Seguiu-se um momento em que a população foi castigada pelo seu apoio ao pretendente português. No meio disso, as obras da Igreja da Sé continuaram. No século XVII quando as obras foram concluídas, a Igreja da Sé apresentava uma planta retangular em estilo renascentista e “chão”. Com materiais vindos de todas as partes do mundo, ao longo dos séculos XVII e XVIII, quer por ordem dos reis e da corte, quer por ofertas, a Sé de Angra embelezou-se com o barroco e com a grandeza das Índias e das Américas. A Sé de Angra tornava-se um símbolo da riqueza do Império Português.
No século XVII nasceu uma lenda ligada à Sé, a do “Menino do Coro e a Sineira da Sé”. Segundo esta, no tesouro da Igreja da Sé existia uma exótica imagem de Santo António de Lisboa, em que este se encontrava vestido como um menino do coro, algo nunca visto. A lenda diz que certo dia, um mestre da capela muito preocupado em conseguir a harmonia musical entre os seus alunos, ameaçou bater num deles caso este não começasse a entoar as músicas na forma correta. O rapaz apavorado fugiu, encaminhando-se para uma das torres da Sé. Subiu a íngreme escada em caracol que levava aos sinos e aos pináculos das torres da Catedral angrense e, quando chegou ao cimo, confundindo o barulho do vento com o barulho de passos, julgou ter ouvido o mestre da capela e atirou-se do alto da torre onde estava. A criança foi salva por um vento divino que a sustentou no ar, voando por três ruas até ser depositada no telhado do Convento de Nossa Senhora da Esperança. Para comemorar esta ação divina, o pai da criança mandou estão fazer a mencionada imagem de Santo António vestido de menino de coro, que durante muitos anos esteve exposta na Sé. O rapaz viria a tornar-se sacerdote.
O Sismo de 1 de Janeiro de 1980, o de maior intensidade dos últimos 200 anos em Portugal, com uma magnitude de 7,2 na escala de Richter, com epicentro a 35km a sudoeste de Angra do Heroísmo, a cidade mais afetada, danificou fortemente a Igreja da Sé. Dias depois, esta começou a reerguer-se, seguindo a filosofia de pô-la como estava, mantendo o interior. A Sé sofreu uma derrocada, em 1983, que destruiu uma das colunas e o frontispício. Quando decorriam as obras de reparação, a Sé Catedral de Angra do Heroísmo foi vítima de um incêndio, a 25 de setembro de 1983, passaram recentemente 30 anos.
O incêndio foi ateado por um jovem que tinha acesso ao interior da Sé e que depois foi declarado doente psiquiátrico, mas na altura houve quem suspeitasse que a ação tivesse sido encomendada. Algumas pessoas ainda hoje dizem que era “um louco”. Segundo a população, o cenário era “assustador”, pois o fogo estava “tão alto que atravessava a rua e ameaçava alastrar-se a vários quarteirões de Angra do Heroísmo”. O medo instalou-se, parecia que “o centro da cidade todo ardia”. Felizmente o fogo foi controlado.
Os prejuízos do incêndio foram incalculáveis, o mobiliário ardeu todo, perderam-se as cadeiras dos cónegos, do coro alto e do coro baixo, os órgãos de tubos, os lustres em madeira e o soalho. A beleza do Barroco desaparecia, com a destruição dos caixotões dos tetos, das imagens esculpidas na parede, das molduras e dos enquadramentos em talha dourada, que arderam. Salvou-se apenas o que era móvel, como pratas, paramentos e telas, que tinham sido deslocados para o salão do seminário.
A Igreja da Sé voltou a erguer-se das cinzas e renascia, mantendo a sua imponência e grandeza. Assim, a 3 de novembro de 1985, a Igreja da Sé foi reaberta ao culto e dedicado o novo altar pelo então Patriarca de Lisboa D. António Ribeiro. Continua a ser a sede do Bispado de Angra e Açores, o maior templo dos Açores. Falta apostar na recuperação de várias peças que aguaram o seu restauro, é preciso valorizar os nossos tesouros.
Texto e Foto/ Francisco Miguel Nogueira | franciscomgl@gmail.com
Fonte: Jornal da Praia